Termina hoje, 29, um dos mais ousados e benéficos programa da Universidade Estadual de Goiás (UEG). Às 20h, no Auditório Ateneu Dom Bosco, Setor Oeste, Goiânia, acontece a cerimônia de graduação dos últimos 55 discentes do Programa de Licenciaturas Plenas Parceladas (LPPs), que ao longo de 15 anos levou qualificação a mais de 29 mil professores do quadro docente estadual.
As duas últimas turmas a receberem o título de licenciatura, Letras e Pedagogia do câmpus UEG Laranjeiras, encerram um ciclo que se iniciou juntamente a criação da universidade e segundo a professora Raquel Teixeira, à época secretária Estadual de Educação, foi um caso de sucesso.
Como tudo começou
O panorama da educação na década de 1990 era de efervescência. Intensos debates sobre os rumos do ensino fundamental e médio davam a tônica das conversas nos espaços de discussão sobre a questão no país. Eram pautas urgentes a reformulação das práticas educacionais e a qualificação dos profissionais de educação frente as novas demandas surgidas com a abertura política e econômica proporcionada pela nova configuração mundial.
Nesse contexto, Goiás contava com um expressivo contingente de profissionais de educação das primeira e segunda fases sem graduação em qualquer tipo de licenciatura em seu quadro. Os chamados professores leigos representavam, à época, em torno de 70% do total estadual. Assim foram criadas as LPPs que ao passo em que leva qualificação aos docentes estaduais reconfigura, também, a educação no Estado. Os 16 formandos em Letras e os 39 em Pedagogia, que recebem na noite de hoje seus graus em licenciatura, são o último capítulo dessa ferramenta de transformação social em Goiás.
Abaixo vocês conferem a entrevista concedida pela professora Raquel Teixeira para a edição nº 1 da revista UEG Viva.
Revista UEG Viva – Qual era a realidade do ensino em Goiás que a senhora, no final da década de 1990, entrou para a Secretaria de Educação?
Raquel Teixeira (RT) – Me dei conta de que, apesar de estar na universidade há muitos anos, formando professores para as redes, eu desconhecia a situação do sistema. Havia uma separação muito grande entre o conteúdo e a parte pedagógica. O professor fazia o conteúdo da sua disciplina, enquanto a parte pedagógica era dada separadamente. Isso fazia com que nós, professores de conteúdo, não conhecêssemos o sistema – o que é muito grave. Alguns dados me surpreenderam: no ano de 1999, 32% dos professores tinha curso superior. Além disso, o fluxo de escolaridade era muito afetado pelos altos índices de evasão e repetência. Esses foram os dois índices que mais me chamaram a atenção. Eu priorizei as ações da Secretaria da Educação para isso: em primeiro lugar, a formação de professores; seguida pela correção de fluxo – as duas caminham juntas.
UEG Viva – Quais foram as principais dificuldades ou críticas ao programa?
RT – Nós estávamos muito acostumados com a academia mais rígida, dos quatro anos em sala de aula. As LPPs eram uma inovação, no sentido de que existiam os professores que atuavam em sala de aula, trazendo suas experiências que enriqueciam o projeto. Algumas pessoas ficaram preocupadas, lançaram a suspeita de que este poderia ser um curso aligeirado, superficial e que não tivesse a profundidade acadêmica de um curso tradicional. Isso era um engano. Nós estávamos lidando com professores em sala de aula, com problemas do dia a dia. As críticas que eventualmente surgiram foram pelo estranhamento de um modelo novo. Sair de 32% para 100% de professores formados era um avanço muito grande.
UEG Viva – A senhora previa o alcance do programa?
RT - Nós sabíamos que, depois de determinado tempo, quando já tivéssemos um volume grande de professores com curso superior, a própria rede de instituições daria conta da demanda futura. As LPPs foram feitas para causar um grande efeito inicial. Depois, restaria um fluxo normal que, neste caso, é de formação de professores. Algumas pessoas estranharam e não entenderam essa visão, mas eu tive muita tranquilidade quanto à qualidade do curso e ao direcionamento do cenário a que ele se destinava, e, principalmente, da eficiência que ele teve. As LPPs são um caso de sucesso.
UEG Viva – Quais são as estratégias necessárias para a valorização dos profissionais da educação?
RT – O primeiro passo para a valorização é o reconhecimento da própria sociedade acerca do papel do professor. O Brasil não tem a tradição cultural de valorizar a educação. Hoje, o Brasil tem cinco problemas graves: o baixo grau de poupança, o saneamento, o meio ambiente, a previdência e a educação. Se prestarmos atenção, estes cinco aspectos da vida tem algo em comum: deve-se investir agora para colher os frutos no futuro. Conduto, o brasileiro tem a cultura do imediatismo, nós não temos a cultura de investir.
UEG Viva – E o que a senhora pensa sobre a capilaridade da universidade?
RT - Quando a UEG vai ao interior e investe na formação de novos professores, a instituição começa a mostrar às pessoas que a sociedade do século XXI é a sociedade do conhecimento e que não adianta só plantar soja, pois o que vai fazer a diferença na economia do século, que é a chamada “economia do conhecimento”, é o capital humano e não o capital agrícola. Se o Brasil quer ser, algum dia, um país que tem o que dizer ao mundo, deve-se investir no capital humano. Temos que investir em educação, ciência, tecnologia e inovação, ou seja, no conhecimento. Para isso, não existe outro caminho a não ser formação e valorização de professores, escolas públicas de qualidade, políticas públicas de valorização da educação. Quando isso acontecer nós poderemos aspirar a ser um país desenvolvido.
(CGCom|UEG)